AS
INSTITUIÇÕES TITUBEIAM!
*Percival
Puggina
Foi assim. Saíramos para jantar, minha mulher e eu. Íamos, no carro dela,
para um restaurante localizado em rua calma de Porto Alegre. Procurando onde
estacionar, subimos a via até encontrar vaga. Dali, caminhamos no sentido
inverso, rumo ao restaurante. Minha mulher seguia alguns passos adiante.
Subitamente, um rapaz com o rosto semi-encoberto materializou-se ao meu lado.
Surpreso com a aparição, esbocei um sorriso que pretendia significar -
"Brincadeira sem graça, moço!". Creio que ele interpretou minha atitude como
desrespeitosa e, por isso, retrucou ao meu sorriso com cara de poucos amigos.
Cenho cerrado, baixou os olhos na direção da arma que apontava. Só nesse
momento, acompanhando o olhar dele, vi a pistola e entendi o que estava
acontecendo. Pediu-me a chave do carro, no que foi prontamente atendido, e a
carteira, que acabei negociando pelo dinheiro que levava no bolso. Alguns metros
adiante, um parceiro pedira para minha mulher que retornasse ao ponto onde eu
estava sendo depenado. Em poucos segundos concretizou-se a
operação.
***
Muito já escrevi a respeito da ideologia que, escarrapachada nas fofas e
seguras instâncias do Estado e do governo, dá causa à proliferação da
criminalidade em nosso país. Tenho mostrado a tolerância das leis penais,
clamado pela construção de mais e mais presídios, e reprovado as misericordiosas
progressões de regime que desembocam num prematuro e fervilhante semiaberto.
Tudo absolutamente em vão, claro. Emitia esses clamores motivado pelo relato de
experiências alheias, muitas das quais bem mais aterrorizantes do que a minha.
Aliás, a bem da verdade, o assalto que sofremos foi sem resistência nem
insistência. Vapt-vupt. Eles queriam o carro e nós que sumissem dali tão
depressa quanto possível. Com o ocorrido, entrei para as estatísticas. Tive meu
choque de realidade. Sou recente vítima de uma ideologia que estimula a
criminalidade, de uma legislação que protege o bandido e deixa a vítima ao
desabrigo, e de uma política de direitos humanos "politicamente correta",
perante a qual eu sou o malfeitor e o bandido é o justiceiro revolucionário.
Aliás, essa é a tese do líder do PCC, o bandido Marcos Willians Herbas Camacho,
mais conhecido como Marcola, que se for objeto de dissertação em muitos cursos
de Direito do país garante título de mestrado com louvor. Escrita com palavras
santimoniosas, a mesma tese já inspirou pelo menos uma Campanha da
Fraternidade.
Aqui no Rio Grande do Sul, durante o governo do petista Olívio Dutra, o
Secretário de Justiça, desembargador aposentado João Paulo Bisol, diante de
clamores sociais ante o vertiginoso crescimento da bandidagem, observou que
também ele, secretário, se estivesse sem dinheiro, com filho doente precisando
de remédios, não hesitaria em assaltar uma farmácia. Passaram-se mais de dez
anos e até hoje só vi farmácias assaltadas pelo dinheiro do caixa. Nenhuma por
comprimidos de antibiótico. Assim, passando a mão por cima, com plena vigência
do desconcertante binômio "a polícia prende com razões para prender e a justiça
solta com razões para soltar", tornamo-nos um país onde o crime é rentável,
compensa e os bandidos passeiam em liberdade.
Horas após o fato descrito acima, relatei-o sucintamente no facebook. Em
pouco tempo, mais de uma centena de mensagens se seguiram, descrevendo
experiências semelhantes ou piores. Um bom número dessas vítimas, dispersas pelo
Brasil, contavam terem sido assaltadas várias vezes (o recordista menciona 18
ocorrências). Pois bem, o silencioso ataque a um casal, a caminho do
restaurante, numa rua tranquila de Porto Alegre, tem a ver com todos esses
relatos e estes tem a ver com o surto de violência em Santa Catarina. Quando o
Congresso decide fazer alguma coisa a esse respeito, como, por exemplo,
retirando o direito a progressão de regime para quem comete crime hediondo, o
STF declara a lei inconstitucional. Esgota-se a paciência dos brasileiros.
Infames linchamentos, que vez por outra ocorrem em regiões diferentes do país,
decorrem, em boa parte, da descrença social nas instituições do aparelho estatal
voltadas para a proteção dos cidadãos. O crime, organizado ou desorganizado,
declarou guerra à sociedade e é inequívoco: as instituições
titubeiam!
______________
* Percival Puggina (68) é arquiteto,
empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas
de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia e Pombas e Gaviões.
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