DEMOCRACIA E DEBATES ELEITORAIS
*Percival
Puggina
E olha que são os pontos altos das campanhas! Durante os processos
eleitorais para os cargos de presidente da República, governador e prefeito, os
eleitores mais interessados aguardam com expectativa a realização dos debates
que, reunindo todos os candidatos, estabelecem o confronto direto entre eles.
Fora dos debates, os candidatos falam sozinhos, com textos e imagens editados
por especialistas em comunicação, notadamente cientistas políticos,
publicitários e jornalistas. Já nos debates é cada um por si, com a cara e a
coragem. O debate é o palco do improviso, do inesperado, da ação e da
reação.
O objetivo de todo processo eleitoral e da publicidade dos concorrentes a
postos executivos é tornar conhecidos os personagens e suas propostas de gestão.
Os debates operam na mesma trilha. Com pequenas variações, as cenas se repetem,
eleição após eleição, mais ou menos como descreverei a seguir. Os candidatos,
dispostos um ao lado do outro, respondem perguntas formuladas pelo mediador e
debatem entre si, dois a dois, o que tenha sido dito. Em sucessivos rounds, o
apresentador enfia a mão numa urna e saca a pergunta (como antigamente, em
tempos saudosos da Educação de qualidade, se sorteavam pontos de dissertação nos
exames orais dos colégios): "O assunto, agora é ... Infraestrutura!", anuncia e
de outra urna saca o nome de quem vai responder. E os temas se sucedem, sempre
os mesmos, referindo problemas recorrentes para obter respostas sempre
iguais.
Todos os leitores já assistiram essa cena incontáveis vezes e certamente
perceberam que os candidatos, de fato, dizem mais ou menos a mesma coisa, tendo
como ponto de partida a afirmação de que aquele tópico terá "prioridade
absoluta" em seu governo. E acrescenta que é preciso investir mais nisso, com
capacidade de gestão, para que a comunidade seja bem atendida. A partir daí o
confronto se trava no plano individual, em torno da capacidade do interlocutor
para fazer o que diz ou de sua credibilidade para criticar o que
critica.
Essa é apenas a primeira metade da história. A segunda se desenrola após
a eleição. O candidato vitorioso, que prometeu fazer e acontecer, faz e acontece
tudo ao contrário do que disse. Suas primeiras, mais urgentes e principais
providências, as prioridades absolutas, são criar novos cargos para os
parceiros, aumentar os vencimentos dos postos de confiança, meter mais um
garrote financeiro nos aposentados, ampliar o orçamento para publicidade, tentar
elevar impostos, taxas e tarifas, e por aí vai. Tivesse o candidato anunciado
uma só dessas medidas durante a campanha eleitoral, teria encontrado as urnas
vazias de votos para si no dia do pleito.
Estou cansado de ver isso. Portanto, sugiro aos grandes veículos de
comunicação uma alteração nas regras para tornar mais proveitosos os debates do
ano que vem. Em vez de perguntar aos candidatos o que eles pretendem fazer,
pergunte-se a eles o que não farão em hipótese alguma. Aí sim, com absoluta
segurança, saberemos o que eles vão, mesmo, fazer. Um processo eleitoral que
convive inconsequentemente com a mentira atenta contra a própria
democracia.
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* Percival Puggina (68) é arquiteto,
empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, articulista de Zero Hora e de dezenas
de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a Tragédia da Utopia e Pombas e Gaviões.Recebido por e-mail.
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