TEMPO DE CONCLAVE E CONVERSÃO
*Percival Puggina
A renúncia de Bento XVI traz para a agenda dados e fatos da
história recente da Igreja Católica. No meio deles, a disputa entre
conservadores e progressistas. Durante as últimas décadas, foi-se
tornando explícita a desastrosa ideologização e o engajamento
político de extensos setores da Igreja numa seqüência que começou
com a preparação do terreno pelos Cristãos para o Socialismo
(CpS), avançou com a concepção de uma Igreja Popular, ganhou
suposta base filosófica através da Teologia da Libertação (TL) e
se ramificou com as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). No fundo,
era o velho biscoito marxista molhado em água benta e servido
segundo a estratégia de Gramsci.
Essas idéias ganharam os seminários, encantaram segmentos da
hierarquia, coincidiram com a ostpolitik do Vaticano nos anos
60 e 70, influenciaram o Concílio Vaticano II, fizeram adeptos em
expressivos segmentos da intelectualidade laica e cativaram a tal
ponto a maioria das editoras religiosas que por volta dos anos 80 era
quase impossível encontrar um livro católico que não estivesse
contaminado pela TL. Foi terrível a influência dessas idéias sobre
a CNBB, no topo, e sobre os seminários, na base. Editavam-se, em
profusão, documentos e livros que funcionavam como difusores do
credo marxista dos autores da moda, cujos nomes, necessariamente,
enfeitavam as notas de rodapé: Leonardo Boff, Frei Betto, Jon
Sobrino, Pablo Richards, Gustavo Gutierrez, entre outros. As próprias
assembléias da entidade dos bispos ganhavam muito mais destaque pelo
conteúdo político dos depoimentos de alguns participantes do que
pela orientação pastoral. Era evidente o alinhamento da face mais
visível da Igreja Católica no Brasil com o discurso utópico e
voluntarista, marxista e comunista, oposicionista e oportunista do
partido que hoje hegemoniza o poder no Brasil.
Ao longo de quatro décadas, em centenas de artigos, mostrei que
essa distorção e perda de foco está entre as causas da deserção
de muitos fiéis que têm fluído para outros credos em busca da
espiritualidade que a minha Igreja se omite em lhes proporcionar.
Sempre esclareci que o amor cristão aos pobres não se pode
confundir com o ódio ideológico aos ricos. Sempre sustentei a
importância das autonomias. Sempre disse que a militância política
é um espaço dos leigos e não dos seus pastores nem dos documentos
eclesiais. Conquistei inimigos. Nossa! Quantos inimigos me
apareceram!
Por aqueles descaminhos, a CNBB, inúmeras dioceses e pastorais
ajudaram a construir e saudaram a vitória petista em 2002 como a
concretização do Reino de Deus. Lá estava Frei Betto, ao pé da
orelha de seu messias de Garanhuns. O humilde metalúrgico do ABC
arribava, enfim, à Brasília terrestre, montado no burrico de sua
simplicidade. Com a diferença de que Lula chegava mais popular do
que Jesus em Jerusalém. O marido de Marisa Letícia vinha para
instaurar o reino definitivo aqui e agora. A estrela avermelhou-se e
se instalou nos jardins do Alvorada. Hosana ao filho de dona Lindú!
No entanto, o homem das promessas desembarcou na terra prometida para
não cumprir qualquer delas. O barbudo em quem depositavam tantas
esperanças precipitou-se do trono de nuvens desde o qual julgava,
dedo em riste, os bons e os maus, para associar-se aos maus e aos
piores. Não fez qualquer milagre. Não multiplicou pães. Não pôs
a correr vendilhões. Antes, chamou-os para os banquetes do poder.
Deixou o burro a pastar e adquiriu um avião novinho em folha.
Uniu-se aos fariseus, aos doutores da lei, aos trocadores de moeda e
virou, ele mesmo, cobrador de impostos. E o seu partido, levado ao
poder pela mão de tantos religiosos, passados dez anos, ataca por
todos os flancos o depósito precioso dos valores e do ensino
cristão.
O momento político interno que passa a viver a Igreja com o processo
sucessório de Bento XVI será, também, tempo quaresmal. Tempo para
exame de consciência. Tempo de revisão de vida. Enquanto chegam a
Roma os cardeais para o conclave, duas forças se mobilizam buscando
influenciá-los. São as forças mundanas clamando agendas mundanas e
as forças inimigas empenhadas na maligna missão de prevalecer
contra a Igreja. Não, não prevalecerão!
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Percival Puggina (68)
é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org,
articulista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país,
autor de Crônicas
contra o totalitarismo;
Cuba, a Tragédia da
Utopia e Pombas
e Gaviões.
Recebido por e-mail.
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