segunda-feira, 28 de julho de 2014

SOBRE O DECRETO-GOLPE 8.243 - SENADORA ANA AMÉLIA

Anatomia do Poder - programa de 22/06/2014, Gen. João Camilo Pires De Ca...

Charlotte Church - Bridge Over Troubled Water



ESTRANHAS CONFABULAÇÕES

Percival Puggina*


          Mergulhou fundo em estranhas confabulações o relatório do TCU sobre a aquisição da refinaria de Pasadena. Saiu ensopado, mas saiu como o governo queria, nada respingando para o lado do Conselho de Administração. Ou seja, para o lado da presidente Dilma, que, à época da inconcebível compra, pilotava o órgão de aconselhamento superior da estatal.

          O jornal O Estado de São Paulo informa, na edição do dia 25 de julho, que o ministro do TCU José Múcio Monteiro, na segunda-feira 21, dois dias antes da sessão de julgamento, esteve reunido em São Paulo com o ex-presidente Lula. Segundo o ministro, foi uma visita para matar saudade e jogar conversa fora. Para Lula, nem isso. Jacaré não vai para o céu e Lula sabe muito bem o motivo. Recusou-se a comentar o assunto. Para as fontes do jornal, no entanto, o encontro efetivamente ocorreu como parte de uma investida do governo para blindar a presidente e evitar danos à sua imagem quando ela está em plena campanha para suceder a si mesma. Até o início da semana havia a expectativa de que o relator do processo, ministro José Jorge, indicaria responsabilidade de Dilma em virtude de sua posição no Conselho à época dos fatos.

          Transcrevo parte da matéria: "Após a conversa com Lula, o ministro do TCU procurou os colegas e ponderou que responsabilizar Dilma neste momento pré-eleitoral seria politizar demais o caso, além de repetir a defesa do governo de que a presidente votou a favor da compra da refinaria com base em resumo incompleto sobre o negócio. Um ministro, ouvido pelo Estado sob a condição de anonimato, relatou que até uma vaga no Supremo Tribunal Federal foi mencionada. A votação foi unânime". Noutra parte da mesma matéria, lê-se: "Lula sinalizou que até mesmo cargos em um eventual segundo mandato de Dilma poderiam ser usados como elemento de convencimento dos ministros".

          No dia 23, enquanto os corredores se agitavam e os celulares esquentavam as orelhas, o ministro Benjamin Zymler pediu vistas ao processo. O pedido, formulado com intuito preventivo, foi imediatamente retirado quando se evidenciou que a maioria dos membros da corte se inclinava em favor da não inclusão da presidente. Nesse mesmo sentido, aliás, posicionou-se o relator, ministro José Jorge, no voto que proferiu. Decisão unânime.

          A questão que fica no ar, sem possibilidade de resposta conclusiva, é a seguinte: a deliberação do TCU foi influenciada, ou não, pelo que ocorreu nos bastidores? O que sim, se sabe, é que as fontes do Estadão relatam algo que, desgraçadamente, se torna muito verossímil porque tem toda a cara do Brasil que, a cada dia, mais e melhor conhecemos.

* Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+ e membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Ave Maria - Jackie Evancho



MACHISMO E COISIFICAÇÃO DA MULHER

Percival Puggina*


          Têm sido frequentes os casos de jovens que se deixam fotografar nuas por seus namorados e, depois, passam pelo constrangimento de saber que essas imagens foram postadas nas redes sociais. As consequências de tão imprópria prova de amor desabam sobre a parte frágil, determinando padecimento, processos judiciais, enfermidades psíquicas, crises de adaptação social e familiar e, em certos casos, suicídio por total incapacidade para enfrentar a situação. Surpreende que, mesmo com a reiterada divulgação de tais casos, algumas moças ainda se exponham em tão desnecessárias liberalidades.

          Estranhamente, num ambiente social como o contemporâneo, ainda existem jovens convencidas de que sua paixão do momento será eterna. E eternamente responsável por elas. Afinal, eles as cativaram, hão de pensar. Falsas rosas de Éxupery, tão confiantes em seus príncipes malandros! Confundem-se diante do que mais desejam. Afligem-se em busca do amor e o confundem com sedução, desejo, paixão. Mas não é assim. A medida do verdadeiro amor é a medida do sacrifício pelo bem do outro. E como não é inteiramente própria da juventude essa capacidade de renúncia, faltam a tais amores tanto as condições da perenidade quanto o longo convívio que proporcione solidez à confiança mútua. É sabido, porém, que estas observações - conselhos, vá que sejam - não costumam ser bem recebidos por aqueles a quem se dirigem.

          Quanto aos namorados pornofotógrafos, esses são malandros de escol, colecionadores de troféus. São canalhas completos, canalhas de Nelson Rodrigues, do começo ao fim de cada uma dessas tristes novelas. Canalhas ao fotografar e canalhas ao divulgar as fotos. Quanto às jovens, pensando sobre a força determinante dessa decisão de se deixarem fotografar assim pelos namorados, percebi que existe algo contraditório aí. De um lado, a jovem está dando prova a si mesma de um rompimento com a cultura da geração anterior. Ela é jovem, autônoma, moderna, liberal e se deixa fotografar como bem entende. De outro - e aqui se esconde a contradição - ela está servindo ao machismo e não à autonomia da mulher! Essa jovem, que se crê autônoma, moderna e liberal, se oferece ao altar do machismo. Ao coisificar-se, serve-o.

          Nos meus tempos escolares, volta e meia aparecia alguém com uma revista Playboy. Rapidamente, os varões da sala nos agrupávamos em torno da mesa e contemplávamos aquelas desfrutáveis deusas da beleza. Nossas colegas do sexo feminino irritavam-se e esbravejavam. Conosco? Para nós? Não. A irritação delas era direcionada para as modelos da revista, para aquelas mulheres, jovens como elas, que se dispunham ao papel de objetos sexuais para agrado e consumo dos rapazes que as folheavam e delas faziam páginas viradas.

          Meio século atrás, minhas colegas sabiam mais sobre si mesmas e sobre sua dignidade. Eram mais sensíveis e mais valentes no enfrentamento do machismo do que certas mocinhas do século 21. 


* Percival Puggina (69) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site www.puggina.org, colunista de Zero Hora e de dezenas de jornais e sites no país, autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia e Pombas e Gaviões, integrante do grupo Pensar+ e membro da Academia Rio-Grandense de Letras.




O QUE IMPORTA.
 

Entre as fantásticas obras escritas por Fernando Pessoa uma das frases que mais gosto é: "Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir. O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto".

Em determinado período de minha vida comecei a escrever sobre um assunto específico - o direito de propriedade -, que me interessava ideologicamente e ao qual me dedicava, em função de um cargo que ocupava.

Há alguns anos, porém, tenho escrito a respeito do que penso ou sinto sobre os mais variados assuntos. Essa mudança ocorreu principalmente após um acidente, que me levou à cama por praticamente dois anos e então, tinha tempo de sobra para refletir sobre minha vida e as pessoas que me cercavam.

Como poli traumatizado, por diversas vezes fui questionado sobre as dores dos ferimentos, mas elas sempre foram muito menores daquelas sentidas pelas descobertas que realizava com minhas observações e pensamentos.

Quando comecei a escrever, os comentários das pessoas eram realmente intrigantes, como o de um conhecido, que ao saber que havia escrito o texto "O homossexualismo na sociedade brasileira" me questionou: "Uai João, mas você entende sobre esse assunto?".

Explicar para uma pessoa que meu texto tratava do comportamento social de forma histórica, no decorrer de séculos, narrando inclusive trechos bíblicos, criaria situações até constrangedoras, pois para algumas pessoas, é difícil entender que foi por meio da história, da literatura universal e das observações que possuímos todo o conhecimento hoje existente.

Mesmo antes da invenção da escrita, o conhecimento adquirido através das observações foi passado por gerações, mas a com a escrita tudo ficou mais fácil. Ela não transmite apenas conhecimentos. Pode transmitir muitas outras coisas, como os sentimentos e é nesse campo que muitos se realizam, pois escrevendo, conseguem expressar melhor o que pensam ou sentem.

Com as novas tecnologias da comunicação, abriram-se espaços inimagináveis uma década atrás. Atualmente, qualquer um pode escrever o que pensa sobre qualquer assunto e em segundos poderá estar sendo lido e debatido em outro continente.

Quem gosta de escrever e hoje utiliza a internet, há alguns anos não imaginava que poderia, em segundos, transmitir a tantas pessoas, o que pensa ideologicamente ou o que sente em relação aos amigos, filhos, netos, um relacionamento, uma paixão ou um amor.

"Escrever é fácil, você começa com maiúscula e termina com ponto. No meio, você coloca ideias", escreveu Pablo Neruda.

"Buscamos, no outro, não a sabedoria do conselho, mas o silêncio da escuta"... "Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha"... "Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa"..., escreveu Rubem Alves. 

Consciente de que, mesmo com um texto transmitindo eletronicamente para milhões de pessoas, muito poucas terão interesse no que foi escrito, escrevo simplesmente porque escrevendo me sinto bem.

A importância do que escrevo pouco importa. O que importa é escrever sobre o pouco que importa.


João Bosco Leal*      www.joaoboscoleal.com.br
 
*Jornalista, escritor e empresário

sexta-feira, 25 de julho de 2014