RESSUSCITANDO A DIREITA
“Algumas perguntas, quando auto-indagadas,
se tornam elucidativas.
Pergunte-se: quero ser pobre no Brasil?
Filho de uma mãe gentil
ou de uma madrasta vil?
Ser tratado como cidadão ou excluído?
Como gente... Ou como bicho?
Clarice Zeitel,
premiada pela UNESCO,
Waldo Luís Viana*
O governo Lula é capaz de produzir milagres. Conseguiu quase o impossível: até uma ameaça de demissão do nosso enorme ministro da Defesa, aquele gigantesco camaleão ideológico, que, fingindo indignação, se solidarizou com nossos comandantes militares, agastados com os descaminhos da futura “Comissão da Verdade”. Logo em seguida, alguns incautos da sociedade civil começaram a chafurdar o decreto-mostrengo dos “direitos dos manos” e perceberam que ele legislava sobre quase tudo, ao arrepio da Constituição. Só faltou dizer, a partir do assembleísmo eterno dos movimentos sociais, como este modesto escriba deveria repartir os próprios cabelos. Não, a pasta de dentes eu ainda poderia escolher, desde que pague os escorchantes impostos desse extraordinário governo! Estado forte é isso mesmo...
De repente, a sociedade mobilizou-se, prevendo a implantação de um socialismo de Estado à la Lula. com ditadura rotativa e culto à personalidade azeitado por propaganda enganosa. Já vimos esse filme antes, afinal todos nós também somos filhos do Brasil. Lula assinou sem ler, eximindo-se de qualquer responsabilidade pelo monumental decreto, que não consultou ninguém importante para ser elaborado, em quase cem páginas, recheado do discurso politicamente correto da esquerda revolucionária. Um verdadeiro darwinismo semântico e antropológico. Uma espécie de “decreto-gay”, que entra em qualquer buraco não colonizado para obter os orgasmos sociais que tanto pretende. Não teme a AIDS da desintegração social, da divisão homicida de um país entre direita e esquerda, porque é exatamente o que deseja. Supõe a esquerda que é forte o bastante para comer o Exército e as demais instituições, em sentido lato e no estrito, também...
Esse decreto é o fermento básico da futura eleição de 2010. Quer jogar a oposição para a direita, desmoralizá-la, e vir com concessões tópicas à moldura já traçada, apenas tirando momentaneamente o bode da sala por motivos táticos. Lula dá de ombros, porque seu sucessor que ature o caos antecipado e que vá queimar a mufa para produzir, no instante certo, ou seja, entre agosto e setembro próximo, uma Carta aos Brasileiros II, que vai colocar os novos postulados da novilíngua: comunismo é democracia; ditador é só amor; povo só quer circo e Brasil é mercosul. Ah, esqueci de incluir o bolsa-família, que garantirá a preguiça e a cachaça de todos os miseráveis da Nação até os cem anos!
A ditadura velada, porém, precisa fabricar um inimigo externo e eterno contra o qual tenha que guerrear. Stálin fez isso nos expurgos de 1936 e Teng Chiao Ping conseguiu o mesmo quando culpou todos os males da Revolução Cultural chinesa ao “bando dos Quatro”. Mobiliza-se todo um povo contra alguém, aqui condecorado com a pecha de direitista e pode ser qualquer um, até alguém que tenha sido militante a vida inteira na esquerda, mas que não tenha saída. Se pensar fora da cartilha, contra os interesses do esquema de Lula, estará antecipadamente condenado e morto. Mas a única peninha é fabricar esse inimigo.
Serra é suficientemente ladino para não cair nessa. Quanto mais adiar a sua candidatura nacional – que a meu ver não haverá – mais atrasa e prejudica os planos mafiosos do governo. Lula tem que ir aos palanques contra alguém, mas contra quem, se o adversário não quer se apresentar? O presidente sabe que perderá as eleições se virar perigosa unanimidade. Se todos concordarem com ele, não se estabelece um jogo, como no futebol, e a multidão pode escolher outra coisa e isso é freudianamente perigoso...
Dessa forma, Lula não pode passar ao largo, tem que incomodar os outros até o fim para fabricar um inimigo. Meu Deus! – grita aflito o presidente – cadê a oposição? Se ela não oferecer o pescoço àquele maravilhoso discurso corintiano do presidente, a Dilma, falsa cancerosa, falsa guerrilheira e falsa doutoranda não vai absolutamente emplacar... Nem com Dirceu, como assessor, aquele abastado magister dixit do socialismo de mercado à moda Carlos Slim...
Os idiotas da oposição, por sua vez, depois de tanto emburrecer durante oito anos, parece que aprenderam e não aceitam mais entrar numa partida com derrota antecipada. Principalmente depois de confirmados os mensalões do PSDB e do DEM. A política brasileira passa por estranha emulação: como todos são culpados, o PT, que copiou, com sofisticação internacional, o mensalão provinciano e mineiro do PSDB e o DEM, com o Arruda de Brasília, que bem sabemos o que é – todos se tornaram inocentes. Nenhum deles será preso ou passará por impeachment. Continuarão roubando pra se eleger e se elegendo para roubar. E os dois grupos básicos em luta no país permanecerão sendo os que estão roubando versus os que querem roubar. Essa é a única cláusula pétrea deste país e que não precisa ser escrita. Quem diria: o Brasil, que chique!, tem uma Constituição não escrita, consuetudinária, e mais eterna que a inglesa, aquela do João Sem Terra!
Não entrando no jogo, a oposição, ovacionando a esperteza, mela a farsa. O governo então, desesperado, começa a mexer nos ossos do porão. Ossos secos, sem nenhum Javé que os possa ressuscitar. O jeito é dizer que não vale o escrito e que agora os terroristas vão julgar os torturadores, a maioria fantasmas que já morreram, e que não representam o Exército empobrecido e proletário que temos hoje. É tudo jogo de cena, para criar uma falsa pugna para agilizar a eleição.
Sem briga no palanque, com aquelas frases de efeito recheadas de palavrões, metáforas futebolísticas e erros de português escolhidos a dedo, onde o presidente finge que ainda é povo – absolutamente não haverá vitória. E os marqueteiros do governo sabem disso.
Com todo o dinheiro que possui à farta, pela exploração e colonização da máquina estatal por oito anos, o governo petista não tem recursos para fabricar um fantoche para ser candidato de oposição. Candidato para perder, ninguém quer o posto. E essa aflição leva os marqueteiros a fabricar esse decreto exdrúxulo para levantar um falso furor num povo anestesiado e de cidadania completamente agachada. Mas o veneno do torpor, inoculado antes, gerou paradoxais anticorpos: a manobra é tão explícita que não faz mais efeito, até porque o doente já está em estado de septicemia moral.
Depois do Big Brother (cheio de indivíduos com necessidades “especiais”), vem o Carnaval (cheio de senhoras livres e senhores alegres), a Copa do Mundo (com afrodescendentes injustiçados) e, finalmente, as eleições, em que Lula pretende eleger seu sucessor contra alguém. A questão é, que alguém? O brasileiro é tão esperto que é como macaco: não bota a mão em cumbuca. Muito menos em cumbuca petista, cujo conteúdo já foi comido ou previamente destinado. E sem um idiota “cristianizado” do outro lado, não se ganha eleição.
Viu, Lula: esperteza demais vira bicho...
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*Waldo Luís Viana é escritor, economista, poeta e muito pouco esperto, porque teima em escrever num país que não tem mais opinião...
Teresópolis, 14 de janeiro de 2010.
Recebido por e-mail. Meus agradecimentos ao Leal.
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