quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Opiniões e Posições



OPINIÕES E POSIÇÕES

(Heitor de Paola - psiquiatra e psicanalista)

O texto abaixo é uma carta que mandei para um jovem debatedor de outro
grupo de discussão que me parece um democrata autêntico e sincero, mas
submetido ao encantamento gramscista da moda.

Tudo começou quando ele
escreveu: "Eu ainda prefiro a democracia petista aos anos de chumbo da
ditadura de 64".

Apenas perguntei: "Você vivenciou os chamados "anos de chumbo" para
poder afirmar isto"? E ele me respondeu que não precisava, pois
também nunca viveu em Cuba e pode dizer que aquilo não lhe serve.

Como eu já estava querendo escrever sobre isto, estou aproveitando
para postar neste grupo, também, onde alguém de fora há uns tempos se
referiu aos "comunistas arrependidos" com desdém, se referindo a mim.

Caro R

Sabe por que você nunca viveu em Cuba? Porque os militares, a pedido
da população, abortaram a tentativa de fazer do Brasil uma Cuba,
pelos mesmos que hoje, na "democracia petista", estão no poder e vão
tentar de novo, pode ter certeza. A frase do Olavo de que "a
democracia leva à ditadura" é o que talvez venhamos a experimentar em
breve e são as verdadeiras intenções dos "democratas" Zé Dirceu,
Genoíno e caterva. Pois eu vivi intensamente aqueles anos: em 64 eu já
estava no segundo ano da Faculdade, era Vice-Presidente do Centro
Acadêmico e, obviamente, como qualquer babaca daquela época, de
esquerda, da AP (a mesma do Serra).

Estive foragido alguns dias, e fiquei dois meses preso.
Perdi um ano de estudos. E me desencantei. Com as esquerdas, não com
os militares. Em 68, inicio do ano, foi oficialmente lançada a "luta
armada". Eu participei das reuniões com gente vinda de Cuba, não é
mentira não, eles estavam aqui fornecendo dinheiro e armas tchecas
para tornar o Brasil uma outra Cuba a serviço de Moscou, como a
original.

Não era nada de democratas em luta contra uma ditadura como hoje
dizem: eram comunistas querendo instalar uma verdadeira ditadura
totalitária!

Eu estudei os textos, meu chapa, não ouvi falar nem li em livrecos
idiotas escritos por ex-seqüestradores. Sabe o que nos era indicado
para ler? Mao Tse Tung, Ho Chi Min, Nguyen Vo Giap, Lenin, Che, Fidel
e, como não podia faltar um francês, Régis Debray, o tal da "Revolução
na Revolução". Como descobri que eu era, autenticamente, um democrata
- mas sem negar os riscos da democracia -, pulei fora e, acredite,
meus "companheiros democratas" me ameaçaram, a mim e à minha então
namorada.

Como eu sou um ávido leitor de livros policiais e de espionagem,
inventei uma carta colocada no cofre de três advogados com todos os
nomes e esquemas, para ser entregue no quartel mais próximo, caso algo
ocorresse comigo ou com ela... e me livrei das ameaças!

Eu frisei que isto ocorreu no início de 68, porque hoje é dito que a
luta armada foi desencadeada contra o endurecimento da ditadura com o
AI 5, quando foi justo o oposto: o AI 5 foi conseqüência do
desencadeamento da luta armada! Você me diz, com toda a sapiência de
historiador: "Heitor, história é história". E eu te respondo: história
é um troço escrito por gente e, como tal, cada um puxa a brasa para a
sua sardinha. Os reais vencedores de 64 foram os que escreveram estas
mentiras que você, como tantos outros democratas sinceros, engole com
facilidade!

Pois no Governo Castelo Branco - que hoje reputo como o maior
estadista brasileiro do Século XX (tenho engulhos quando ouço dizerem
que este idiota pomposo do FHC é estadista!) - e também nos primeiros
anos do Costa e Silva, o Brasil era uma efervescência cultural. No
teatro surgiram grupos como o Opinião que atacava publicamente o
regime. A peça "Liberdade, Liberdade" era um libelo contra a
"ditadura". Surgiu "O Pasquim" que ironizava os "milicos" e o
Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto) com seu FEBEAPÁ (Festival de
Besteiras que Assola o País - como faz falta hoje em dia!) que não
poupava ninguém. Juca Chaves, ácido crítico dos militares (sua modinha
"Brasil já vai à guerra" devia irritá-los profundamente), cantava à
vontade.

Aliás, ainda em 70 (Governo Médici), ele dizia o que bem entendia no
Circo Irmãos Sdruws, no Parque da Catacumba, na Lagoa Rodrigo de
Freitas, Rio. Isto não é história escrita, eu fui a três shows.

Ocorreram os Festivais da Canção, com as músicas anti militaristas de
Geraldo Vandré - hoje um puxa-saco dos "milicos" da FAB - e as do
Chico Buarque, entre muitas outras...

O Caio Prado Jr, comunista de carteirinha, publicava em sua Editora o
que bem queria, bem como a Ed. Civilização Brasileira. A velha editora
do PCB, a Editorial Vitória Ltda, editava e distribuía livros de
Marx, Engels e Lenin. Sua sede ficava na antiga Rua das Marrecas (hoje
voltou a se chamar assim), à época Rua Juan Pablo Duarte, no Centro do
Rio, num sobrado que tinha sido a sede do Partidão no Estado da
Guanabara. Isto, meu caro, não é história, fui à minha estante agora
mesmo buscar um livro editado em 64 e que eu comprei livremente, em
livraria aberta, em 1970 (Médici): "A origem da Família, da
Propriedade Privada e do Estado", do Engels, de quem Marx era gigolô.
Em 1971, comprei da Editora Saga, também de orientação comunista, "A
História da Revolução Russa" de Leon Trotski, em 3 volumes de lombada
vermelha, como sói!

Se você não me chamar de mentiroso, ou como fez com a A. e o P., levar
no sarcasmo hostil, vê se abre a tua cachola para algo que não seja a
"história oficial".

Houve sim uma guerra revolucionária em que ambos os lados mataram. Por
que raios só os de um lado hoje recebem comendas, indenizações e
aposentadorias milionárias, status de pobres vítimas; e os do outro
são desmoralizados, suas corporações são sucateadas - como se
mantê-las fosse só do interesse deles e não da Defesa Nacional,
cáspite! - têm seus soldos achatados e suas aposentadorias ameaçadas
de serem tungadas para sobrar dinheiro para o BNDES mandar para a
Venezuela?

Adiantando-me a algumas idiotices que já ouvi: não, meu caro, não sou
puxa-saco de milicos nem o Olavo de Carvalho é meu guru.
Estou numa situação curiosa na qual a "tchurma" da esquerda me chama
disto aí, e os nacionalistas de direita me chamam de entreguista
porque não concordo com anti-americanismo obsessivo reinante.
Incrível, não?

Para terminar, um pouco só de teoria histórica. Hanna Arendt - que já
não é lida, sequer conhecida dos modernos "historiadores" - fez uma
diferenciação entre regimes autoritários e totalitários, diferenciação
esta que as esquerdas execram, pois põe a nu suas mentiras: "Os
primeiros são regimes [como o de 64] em que alguns são perseguidos,
mas não se impõem o pensamento único [tanto que a esquerda venceu no
terreno "intelectual"]. Os outros são aqueles em que se impõe o
pensamento único do qual não pode haver a mínima discordância
[...senão, paredón!]. Nos primeiros, a imprensa é censurada [o que
ocorreu aqui]; nos segundos, a imprensa é totalmente destruída só
sobrando o órgão do Partido condutor das massas [seja o Pravda, o
Granma, o Vöelkischer Beobachter ou o Popolo d'Italia]."

Leia algo mais dos que as cartilhas oficiais, que você só tem a se
beneficiar.

Atenciosamente.

Heitor de Paola

Transcrito em 27 de novembro de 2008

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